quinta-feira, 17 de junho de 2010

Livro digital pode democratizar a leitura, mas muda a indústria do livro

Livro digital pode democratizar a leitura, mas muda a indústria do livro
Especialistas atribuem papel fundamental aos professores para incrementar a leitura e vêem no livro digital uma oportunidade de disseminação do conhecimento, mas que traz impactos para a cadeira produtiva
Os universitários estão lendo menos? Como estimular a leitura? O livro digital ameaça as editoras e sugere o desaparecimento do livro tradicional? Ou há novas possibilidades de negócios na cadeia do livro? Estas foram apenas algumas das questões discutidas durante a XXIII Reunião Anual da Abeu (Associação Brasileira das Editoras Universitárias) que reuniu, na sede da Fundação Editora da Unesp, em São Paulo, entre os dias 7 e 10 de junho, profissionais do mercado editorial e acadêmicos para reflexão sobre a leitura na universidade e o livro digital.
Segundo Eliana Yunes, da Cátedra Unesco de Leitura (PUC-RJ), pesquisa realizada com universitários revela que o índice de leitura dos estudantes é baixíssimo ao ingressarem na universidade, mas, ao saírem, há uma melhoria significativa, da ordem de 20%. Um aspecto fundamental levantado pela especialista é o papel dos professores como mediadores da leitura, "ensinando os alunos a lerem os textos, destrinchando-os, articulando-os, correlacionando os conhecimentos".
Outro fator identificado como estimulante é o acesso aos bens. Nesse sentido, "a internet configura-se como um instrumento facilitador", afirma Yunes, ressalvando, entretanto, que não é neste espaço que se forma um leitor. "A universidade pode formar novos e perenes leitores, mas cabe ao professor perceber e trabalhar a heterogeneidade de seus alunos", referendou João Luiz
Ceccantini, professor do curso de Letras da Unesp, câmpus de Assis e vencedor do Prêmio Jabuti 2009, com o livro Monteiro Lobato: livro a livro. Carlos Erivany Fantinati, docente no mesmo câmpus, reiterou a importância de o professor exercitar a explicação de texto que, para ele, "não se trata de apenas elencar seus elementos constitutivos, mas sim de identificar os elos e liames entre esses elementos", tornando a leitura um desafio permanente.
Para o filósofo Pablo Ortellado, professor da USP, a digitalização do livro tem um impacto fundamental na difusão do conhecimento entre classes sociais, que antes não conseguiriam adquirir os livros. A renda familiar de muitos estudantes é inferior ao valor da bibliografia solicitada em cursos universitários. Sem a digitalização deste conteúdo, eles não teriam uma formação adequada, como explica Ortellado, que também é coordenador do Grupo de Pesquisa em Políticas Publicas para o Acesso à Informação (GPOPAI). "Podemos fazer um comparativo com a indústria fonográfica, que precisou se reinventar após a digitalização da música. Eles utilizam a disseminação de arquivos em MP3 para divulgar o produto. E seu modelo de negócio passou por reestruturações", diz Ortellado, para quem as editoras deverão repensar seus modelos de negócios.
Segundo dados do Observatório do Livro e da Leitura, pelo menos 3% dos leitores brasileiros são adeptos de mídias digitais (dados de 2008). "O livro digital veio para ficar", afirmou o diretor da entidade, Galeno Amorim. Nesse sentido, Flávia Garcia Rosa, presidente da Abeu, foi enfática ao afirmar que "os professores universitários devem estar atentos aos desafios e possibilidades deste novo cenário".
Ainda não há números oficiais sobre a venda de conteúdo digital no Brasil, mas estima-se que cerca de 7 milhões de habitantes baixem livros diariamente pela internet e, destes, a maioria é jovens de 14 a 17 anos. Segundo o secretário Municipal de Cultura de São Paulo, Carlos Augusto Calil, há um esvaziamento nas bibliotecas de universidades, pois "os alunos preferem pesquisar na internet a buscar livros na biblioteca".
Mudanças no mercado editorial - Se de um lado há uma perspectiva de ampliação de acesso aos bens culturais, o livro digital impõe novos desafios para a indústria livreira. Durante a reunião, alguns participantes expuseram suas primeiras experiências com o livro digital. No caso da Imprensa Oficial de São Paulo, Hubert Alquéres, presidente da entidade, diz ter ficado muito surpreso com a quantidade de downloads e revelou que "algumas pessoas que baixam o livro, depois de ler, procuram o exemplar em papel, o que vai na contramão da ideia de que o digital substitua o tradicional".
Já o editor executivo da Editora Unesp, Jézio Hernani Bomfim Gutierre, contemporiza: "O e-book não deve ser considerado uma salvação para a difusão e tampouco o fim das editoras."
Experiência espanhola - Dentre os estrangeiros, Antonio Ávila Álvarez, diretor executivo da Federación de Grêmios de Editores de España, e Inés Miret, diretora da Neturity/Madri, apresentaram uma pesquisa sobre o impacto da digitalização no catálogo, canais de distribuição e vendas e políticas de preços na Espanha. Algumas constatações: por lá, os editores já admitem uma queda no preço de capa, para o formato virtual, entre 30% e 50%. E a aposta é que em oito anos a receita com a venda de livros digitais ultrapasse o volume de vendas de livros impressos em papel.
Dados da Fundação Germán Sánchez Ruipérez apontam que, naquele país, dos 50 primeiros livros mais visitados da Biblioteca Hispânica Digital, 40 são novos. "Até o fim de 2010, esperamos disponibilizar na rede cinco mil títulos", diz Álvarez.
Para o diretor presidente da Editora Unesp, José Castilho Marques Neto, o encontro representou um marco para que as editoras universitárias se situem em relação ao que está acontecendo."Ninguém tem certeza do que virá daqui para frente, mas essa é uma discussão substantiva que nos dá maior tranquilidade para buscar novos caminhos", disse. A Editora Unesp lançou, neste ano, uma primeira coleção de livros digitais, com acesso totalmente gratuito e disponível para download em www.culturaacademica.com.br. Mais de 35 mil downloads foram feitos em menos de três meses.
Editora UNESP

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